quinta-feira, 30 de abril de 2009

ABORTO - REFLEXÕES MAIS MADURAS SOBRE O CASO DE ALAGOINHA


Em atenção aos comentários deixados em meu artigo ABORTO - O mundo está ficando muito louco mesmo!, destaco que à época optei por tratar nele apenas das duas crianças abortadas, pois minha meta era acrescentar aos demais pontos que estavam então em debate um que considerava e continuo considerando essencial (embora tenha ficado esquecido) para (1) a leitura do episódio e (2) a participação na escolha de qual seria a saída mais apropriada para ele - participação essa que foi, sem falsos trocadilhos, abortada no aborto. Entendo que (i) o agravamento peculiar do dano (estupro) sofrido pela criança de 9 anos que se deu com a gravidez, (ii) a realização do aborto e (iii) a declaração da excomunhão são pontos que não existiriam sem a prévia existência dessas duas crianças com vida no útero da menina, motivo pelo qual, entendo que o debate não poderia as deixar de lado. Entendo, também, que em nenhum momento a questão foi abordada sob a verdade de que, embora os envolvidos estivessem pagando pelo crime do execrável, seriam as crianças que, com a vida, seriam punidas. E, não entendendo como esse ponto foi subtraído do debate e substituído pela raivosa acusação de atraso da Igreja em suas “posições dogmáticas”, resolvi lançar o argumento.

Faço minhas as palavras do Padre Paulo Ricardo: “Está todo mundo morrendo de dó dos enfermeiros que foram cúmplices do crime de aborto porque a Igreja Católica, num ato de crueldade terrível, excomungou os pobrezinhos.” (http://www.padrepauloricardo.org/) Quando, na verdade, foi a Igreja a única nesse episódio que considerou que, além da criança de nove anos, existiam, também, as duas crianças ainda em gestação, gestação essa que só poderia ser interrompida se houvesse laudo médico demonstrando (vamos nos lembrar que estamos diante de uma ciência que precisa fundamentar seus prognósticos) o risco de vida da menina e não apenas alguns médicos dizendo isso (vamos nos lembrar de que a retórica não é instrumento utilizado pela ciência).

Ciência não é fundamentada em bom senso ! E se o bom senso nos sugere a conclusão de que nesse episódio as três crianças morreriam, a ciência mostra em diversos outros que a gestação nessa condição extrema pode sim ser viável (27.610 casos na faixa 10-14 anos no Brasil em 2006, 260 de gravidez dupla, para ser mais exato - http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?sinasc/cnv/nvuf.def).

PS.: para mais informações sobre o caso (e não da historinha que foi inventada e disseminada), acesse: http://www.estadao.com.br/vidae/not_vid336023,0.htm; para informações sobre outros casos de gravidez de menina de 9 anos (estes sem aborto), acesse: http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u123617.shtml; http://noticias.uol.com.br/ultnot/afp/2006/12/02/ult34u169397.jhtm; http://www2.correioweb.com.br/cw/EDICAO_20020911/vid_mat_110902_36.htm

7 comentários:

D disse...

“Ciência não é fundamentada em bom senso!”


Ciência não é fundamentada em bom senso, ciência é fundamentada em evidências empíricas. A religião não é fundamentada em evidências empíricas, mas em fé e fé implica em grande aplicação do que você tratou como bom senso. Pois fé, desprovida de bom senso, termina em homens se explodindo dentro de carros em busca de tantas virgens no céu.
O aborto é um assassinato? Sim. A igreja condena o aborto com excomunhão? Sim. Então vem a pergunta: qual o último caso relevante na imprensa em que a igreja declarou excomungada a responsável por um aborto? Somos incapazes de lembrar. Mas o bispo resolve escolher um caso muito polêmico para fazê-lo. Um caso que envolve pedofilia, estupro, violência (outros vários fatores que pasme, não são passíveis de excomunhão – inclusive se um pai assassina um filho). E qual é o resultado que o bispo consegue? Rudeza contra a igreja. Perda de fiéis. Maculação da imagem da igreja e por consequência, da imagem de Jesus! Que de forma alguma representa somente a Igreja Católica, mas uma forma de se viver a vida, independentemente de religiões. Isso é falta de bom senso, donde concluísmo que a igreja e a religião também não são fundamentadas em bom senso e que para terminar sem um pingo de bom senso colocaríamos a frase: “Em boca fechada não entra mosca”.

De

Rodrigo disse...

Alguns pontos antes de voltar ao tema:

1. a excomunhão, como consta no Código Canônico, necessário para entender o caso, ocorre automaticamente (latae sentantiae), conforme http://www.vatican.va/archive/ENG1104/__P57.HTM;
2. o que o bispo fez foi apenas declarar o que automaticamente ocorreu;
3. por isso, não há necessidade de declara-la a cada aborto realizado para que a excomunhão gere efeito (expulsão do membro da comunidade católica)
4. por isso não ouvimos ou lemos isso com freqüência
5. salvo quando há interesse em utilizar esse fato para desviar nossa atenção do que realmente importa (aborto);
6. que foi o que ocorreu nesse caso.

Portanto, se o fato gerou “Rudeza contra a igreja. Perda de fiéis. Maculação da imagem da igreja e por conseqüência, da imagem de Jesus!”, é básico entender que isso decorreu do tratamento que foi dado ao tema pela mídia (que buscou mostrar um suposto fundamentalismo e atraso da fé) e não do tratamento que foi dado ao tema pela Igreja, que buscou proteger a vida de duas crianças, tornando-se vítima desse ato (porque a forma não se encaixa nos padrões da atualidade).

Mas, de novo, o foco não era para ser esse (como proponho em meu artigo). Esse foco é a própria distorção criada pela máscara ideológica para buscou deslocar a polêmica do ponto onde deveria estar (aborto de duas crianças) para onde ela não deveria estar (na Igreja). E por que a Igreja? Pois é um dos últimos bastiões que repelem as doutrinas que seqüestraram a consciência humana, aquelas que ressurgiram no Iluminismo, mas que já provaram (como ocorreu 1. com o sofismo e 2. com o cinismo, o ceticismo, o epicurismo e o estoicismo), não obstante o poder de ressurgirem de quando em quando, não terem condições de durar mais do que 5 séculos. E por que seqüestraram a consciência humana? Pois tentaram e continuam tentando nos ensinar que o que tem verdadeiro valor e poder evolutivo não é a ação que decorre do indivíduo (consciência), como ensinaram principalmente Jesus e Sócrates, por exemplo, mas sim a ação que nasce da estrutura social (e, na maioria das vezes, que se impõe ao indivíduo); são aquelas doutrinas que pregam que a solução para nossos problemas não está na mudança do indivíduo mas na mudança da sociedade; são aquelas que pregam, por exemplo, que ao mesmo tempo que você pode fazer o que quiser em relação ao sexo pregam que as leis (inclusive as religiosas) precisam mudar para punir melhor os abusos sexuais; ....

E, partindo disso para voltar ao tema, pergunto: diante de todos os dados que apresentei meu artigo, estava a Igreja errada ao defender a vida das duas crianças abortadas? É essa a resposta que busco pois é esse o núcleo do que discutimos.

D disse...

Os seis itens que você listou não vinham ao caso. Sei que a excomunhão é automática, o que tento demonstrar é que se a excomunhão é automática porque o bispo precisou declará-la? E se o fez, com qual intenção fez? Chocar as pessoas expondo uma criança de nove anos estuprada? Colocando um caso tão horrível na mídia para enobrecer o “direito canônico” no caso do aborto? Abortar não pode, mas estuprar pode,assassinar pode, ter sexo com criança pode? É isso o que a “igreja de Cristo” quer pregar? Creio que não.

Quanto a questão do tratamento dado pela mídia, creio que a mídia não precisa necessariamente formar nossa opinião. Deus nos deu um cérebro não? Temos dentro de nós um senso de justiça que não se encaixa muito bem dentro do direito canônico.

Eu não tenho ideologia e compreendi muito bem o engano do bispo. Ele usou um caso onde haviam INÚMEROS crimes para nos mostrar quanto o direito canônico é FALHO. Quando pressupõe que um crime pode se sobrepor à outro dentro da realidade do que é ser CRISTÃO. A doutrina da igreja sequestrou a consciência humana há muitos anos atrás, e hoje, esse texto que escrevo certamente não me levará a uma fogueira. Tenho certeza que não morrerei em uma fogueira da santa inquisição. Novos e bons tempos.

“diante de todos os dados que apresentei meu artigo, estava a Igreja errada ao defender a vida das duas crianças abortadas? É essa a resposta que busco pois é esse o núcleo do que discutimos.”


A igreja acertou. Expondo o direito canônico à lógica e ao bom senso, demonstrou às pessoas o quão equivocada e anti-cristã pode ser a “igreja de cristo”. Meu ponto é, se a excomunhão é AUTOMÁTICA, porque o bispo escolheu um caso tão complexo para dizer o óbvio, que aborto é assassinato? E porque um assassinato não é passível de excomunhão se está nos dez mandamentos? A igreja errou na abordagem do assunto e como já disse antes, só conseguiu trazer para si mais hostilidades e menos amor. E o princípio do cristianismo é o AMOR.

Abaixo a burocracia religiosa!
Não queira me matar, você é meu primo legal, hahahaha.

Abraço.

De.

Rodrigo disse...

D, leia o relatório do caso (http://www.estadao.com.br/vidae/not_vid336023,0.htm) e entenderá o que levou o bispo a declarar a excomunhão.

D disse...

Esse caso é realmente um caso muito complicado, mas eu jamais optaria pelo aborto. Aborto é assassinato. O que proponho como discussão são os critérios utilizados para decidir o que te aparta da presença de Cristo (excomunhão) e o que não. Se quiser discutir esses critérios do direito canônico acho que vai ser muito produtivo.

Abraço.
D.

Rodrigo disse...

Mais pra frente podemos discutir esse tema. Agora ainda não dá pois não o estudei com a mínima atenção necessária (embora tenha passado por ele em alguns textos durante a faculdade). Tudo o que sei é o que ouço falar por aí e isso está um pouco longe de ser o suficiente.

Rodrigo disse...

Achei alguns links interessantes com mais dados para entender esse velho movimento que opõe:

- quem acredita ser a verdade intangível e quem acredita poder atingi-la;
- quem aplica a retórica e quem aplica a dialética + lógica;
- quem fundamenta suas posições pelo critério da atualidade e quem as fundamenta pelo da veracidade;
- revolucionários e conservadores;
- sofistas e filósofos,
- esquerda e direita;
- filosofia moderna e Igreja,
- Wittgeinstein e Husserl,
- gnosticismo e cristianismo, ... :

http://en.wikipedia.org/wiki/Second_Sophistic
http://www.livius.org/so-st/sophistic/second_sophistic.html

É interessante perceber que o embate entre direita e esquerda é apenas uma parte do verdadeiro embate milenar, uma manifestação histórica dentre diversas outras desse embate.